pecus bilis
um lagarto desmontável
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História
No fim do ano resolvi limpar o criado-mudo de leituras interrompidas, inspirado por um artigo sobre alzheimer afirmando que, em termos de esforço mental, a leitura recreativa é tão preguiçosa quanto ver TV. Por saber que não ia dar nenhum trabalho, li umas duzentas páginas por dia (com um certo exagero) durante a semana da virada, e embalei. Um dos livros que, sem nenhuma preguiça, li desde o começo, apesar de já ter chegado mais ou menos na metade, era sobre a Batalha de Salamina, a batalha naval que afastou os persas de Atenas, escrito por um historiador remador, sob o ponto de vista das trirremes, mil naus a remo se trombando num estreito.
A principal fonte do livro é o antigo História, do Heródoto, escrito 50 anos após os fatos, em 430 a.C. Dei uma fuçada e achei num sebo talvez a única edição em português completa, traduzida direto do grego, da década de 80. Umas 500 páginas numa letrinha bem pequena, mas absolutamente fascinante, uma leitura muito divertida. Um mundo misterioso, com centenas de povos em diferentes estágios de civilização, com estranhos hábitos, crenças e rituais. É cheia de digressões sobre lendas, geografia, casos, e costumes, com as devidas ressalvas sobre o grau de confiabilidade das fontes. E a enorme importância dos oráculos, sempre tomados como absoluta verdade, sempre precedidos de sacrifícios aos deuses. Salvo uns poucos casos de oráculos corrompidos, nunca o oráculo errava, era mal interpretado na sua linguagem simbólica.
A História abrange todo o mundo conhecido na época. A Europa não tinha norte, acabava em descampados desconhecidos além do Danúbio. A Ásia acabava na Índia. A África, ou melhor, Líbia, a terra enorme a oeste do Egito, já teria sido circunavegada, passando-se pelas Colunas de Heraclés (Gibraltar), as terras das palmeiras e povos de pequena estatura, até chegar-se à Etiópia, terra dos homens mais altos e bonitos – segundo o Heródoto – , e cujos “trogloditas” eram os melhores corredores do mundo. O território desconhecido terminaria no grande Rio Oceanos, de existência questionada pelo primeiro historiador.
Quando cheguei em casa com o livro, minha filha mais nova disse depois ter tido arrepios com a coincidência: tinha acabado de ver O Paciente Inglês, no qual o História tem um papel muito importante, e ainda, visto um episódio de Seinfeld no qual o filme é ridicularizado pelo quarteto. Ou sincronismos, como preferem alguns. Os surpreendentes alinhamentos de fatos que fazem supor a existência de uma engenharia oculta, destino. Os gregos antigos são tidos por pessimistas, em função de sua visão de mundo tornada evidente no esquema da tragédia: o oráculo prevê a desgraça, tenta-se contorná-la com as medidas mais drásticas, mas a profecia se cumpre da forma mais inesperada. O História está cheio de exemplos dessa estrutura, que não prescinde de um forte conteúdo moral na relação entre homens e deuses, que costumam premiar as virtudes e castigar os malfeitos, numa perspectiva de responsabilidade coletiva que atinge até povos inteiros, gerações depois.
Estes mesmos gregos, que estão muito mais próximos de nós do que pensamos, inventaram o veneno e o remédio, descobriram a saída da prisão do destino: a metafísica. Entre A Batalha de Salamina e o História, li A Caverna, do José Saramago, e tive também vários minutos seguidos de arrepios e calafrios, quando nos vi mumificados olhando para o fundo da caverna, encontrada no subterrâneo do subterrâneo do Shopping Center Iguatemi.