
Acordar minutos antes do despertador tocar, consultar o relógio com pouca esperança de ainda haja tempo pra dormir um pouco. Esfregar os olhos, tomar coragem pra sair das cobertas quentes como quem mergulha na piscina sem saber a temperatura da água. Lá fora ainda está escuro e provavelmente frio, talvez até ventando ou ainda uma leve garoa.. Dez minutos para a seqüência de providências: tomar água, urinar, por as lentes de contato no olho remelento, escovar os dentes apressadamente, ficar nu, pesar, vestir, a dúvida em evacuar agora ou na volta. Encher o “squeeze” de água, comer uma barra de cereais, pegar a chave, a carteirinha, a bicicleta com os pneus já um pouco murchos, e pedalar pelo asfalto irregular, os músculos ainda doloridos do dia anterior, a força extra da subida da ponte, a troca de marchas nada suave do câmbio barato, o freio guinchando na descida, bater na porta da passagem de pedestres da alça da ponte da cidade universitária para que o sonolento guarda abra, contornar os bloqueios que seguram os pedais e acelerar já paralelo à raia. Abrir com a mão o portão automático há meses quebrado, deixar a bicicleta no apoio, tirar a chave da meia, pegar o squeeze, ir até a garagem, cumprimentar o pessoal tomando várias decisões rápidas da modalidade de cumprimento a cada um, de acordo com a circunstância, alongar-se se não estiver atrasado, ouvir as piadinhas bobas de sempre, levar os remos para o flutuante, tirar o barco da estante, por no cavalete, checar as peças móveis, por o barco sobre a cabeça, andar até o flutuante, por o barco na água, encaixar os remos nas braçadeiras, embarcar com cuidado, remada um dois três quatro, um ou outro educativo, treino, tiro, ignorar como os outros os inúteis comandos do chefinho na proa, se a ressaca for braba torcer pra acabar logo, se estiver inteiro achar pouco. Encostar, soltar o parafuso da braçadeira, tirar o remo, calçar o tênis, por o barco sobre a cabeça, levar até o cavalete, secar o barco ou buscar o remo, por o barco na estante, escamotear o alongamento, despedir-se vagamente, pegar a bicicleta no cavalete, pedalar até em casa já tendo que contornar os pedestres na ponte, largar a bicicleta debaixo da escada, sentar pra tomar café ou correr até o trono, se for necessário, de qualquer jeito folhear o jornal. Ficar nu, pesar-se, tomar banho, pentear-se, fazer a barba, escovar os dentes, passar fio dental, vestir-se, pegar as contas sobre o móvel da sala, entrar no carro, acionar o controle remoto para abrir o portão, ligar o rádio, e pegar o caminho da roça.