Foto: EstadãoO sistema de aquecimento de água da minha casa é a gás, de passagem, alimentado por um grande bujão de 190 quilos, que é abastecido por um caminhão com uma mangueira. Era uma boa opção quando instalei em 1997, e agora deve ser uma das piores. O aquecedor é “computadorizado”, e a despeito das minhas fantasias do que isso podia significar quando comprei, nada mais é do que termostato digital. Essa gracinha funciona muito bem com um pressurizador, e garante banhos magníficos. Acontece que o tal aparelho tem um controle remoto ligado por um fio, que os instaladores se recusaram a passar pelo mesmo conduíte do cabo de força, o único que conduzia até a laje superior. O controle remoto ficou lá no telhado, junto com o aquecedor. Cada vez que falta energia, sou obrigado a subir no telhado e “reprogramar” o termostato, que volta para o zero. Pra subir na laje superior, há uma escada “de marinheiro”, que sai de um terracinho do piso superior, chumbada na parede. Quando mudei minhas filhas eram pequenas, e eu fiquei com medo que elas se aventurassem no telhado. Cortei a escadinha, que ficou com o primeiro degrau a um pouco mais de um metro do chão. Por conta dessas falhas, volta e meia subo no telhado, o que é um pouco trabalhoso, mas não é uma experiência de todo má. Às vezes está frio, ou chovendo, ou estou dormindo, de pijama, e tenho que subir, apertar os botõezinhos, pi-pi-pi-pi-pi-pi, e o aparelho volta a funcionar. É forçado, mas é razoavelmente esporádico, e assim acaba sendo legal. Gosto de subir no telhado, e jamais subiria não fosse esta característica da casa. Não é nenhum alpinismo, mas é um ponto de vista aéreo da redondeza, uma sensação muito agradável, com o friozinho na barriga das beiradas a uns sete metros de altura. Se eu vestisse uma máscara de esqui, um pijama laranja, pegasse o facão do jardineiro e um celular, me sentiria o próprio presidiário amotinado. Na vida real, a altura seria maior e o frio na barriga também, pois envolveria risco de ser morto, e causar muitas mortes. Na pele de um dirigente de uma organização criminosa, haveria a sensação de poder de estar orquestrando uma rebelião de dimensões estaduais, em comunicação com outros líderes, cada um no telhado de um outro presídio cercado pelas forças mais letais da polícia, contidas apenas pela vida sem valor de alguns reféns. Uma causa tão sem razão como tantas outras. Eu no telhado estaria dando telefonemas muito menos interessantes. Mesmo assim, acho que a próxima vez que faltar energia, vou subir lá com um celular.